- Corre, corre!
Ele corria e segurando na mão dele
eu ia atrás. Era uma mistura de sentimentos: medo, insegurança e desespero. Eu
não sabia o que estava acontecendo, ele só mandava acompanha-lo e acompanhava-o
sem saber pra onde íamos. Olhava para trás e podia ver pessoas chorando e
crianças gritando pela mãe. Parecia o fim do mundo. Será que a profecia do dia
21 de dezembro de 2012 tinha se concretizado mais cedo? Eu olhava pra ele com
uma cara de assustada e ele mesmo estando assustado parecia estar seguro de si
para não me fazer mais medo. Olhava pra mim e dizia: “Eu prometo nunca te
deixar.”. Nosso relacionamento não estava indo bem, mas a gente ainda se amava
como a primeira vez que nos vimos.
- Tenho um lugar onde podemos ir e
vivermos em paz!
Aquilo foi uma luz no fim do túnel.
Só que eu ainda não sabia o que ocorria.
- O que está havendo aqui, amor?
- A Terra está se acabando.
Terremotos, furacões, tsunamis... O mundo está perdido.
Olhei ao redor e pude ver a destruição em que
se encontrava a cidade. E me veio uma questão na cabeça: se o mundo está
perdido onde a gente poderia ir sem que essa desgraça nos acompanhasse? Eu não
sabia e naquele momento não me preocupei em saber, eu só precisava confiar
nele.
- Temos que arranjar comida para
levar.
O mercado mais próximo ficava a
quarteirões de onde estávamos e precisávamos chegar o mais rápido possível
antes que ocorressem mais desastres. Olhamos para o lado e vimos um Chevette
estacionado ele olhou pra mim e resolvemos roubá-lo. Não demorou muito para que
o trabalho fosse concluído. Ligamos o carro e fomos em direção ao mercado. No
caminho pessoas imploravam por carona, ficavam em frente ao carro, mas ali eu e
ele só pensávamos em nós e em tudo que planejamos nesses anos em que ficamos
juntos. Eu só pedia pra ele acelerar e fechava os olhos, mas era inevitável
escutar o barulho que fazia quando atropelávamos alguém. Chegamos ao mercado,
ele disse que ficaria dentro do carro e eu entraria pra pegar mantimentos, pois
sem o carro não poderíamos ir ao lugar onde ele planejava. Entrei e estava
vazio. Peguei tudo o que via pela frente, desde o que ele gostava até o que ele
odiava e não comeria de qualquer jeito. Coloquei tudo num carrinho e saindo do
mercado um homem apontou um revólver para mim e pediu o carrinho. Não sabia o
que fazer se deixava levar ou se me arriscava gritar e morrer ali mesmo. Até
que meu amor apareceu e deu uma paulada na cabeça do cara. Eu me desesperei,
mas lembrei de que ali era matar ou morrer.
Fomos em direção ao carro, colocamos
os mantimentos nele e continuamos nossa viagem rumo ao desconhecido pelo menos
pra mim. Não aguentei e perguntei:
- Pra onde estamos indo?
- Garanto que vai gostar, você vai
ver.
Vi que ali era confiar e eu não tinha motivos para
desconfiar-me dele. Viajamos por algumas horas e paramos simplesmente no meio
do nada e o escutei cochichar: “Acho que é aqui”. Ele olhou pra mim e disse:
- Vem, desce.
Desci um pouco desconfiada, olhei para os lados e respirei
ofegantemente.
- Calma, não precisa ter medo.
Eu sentia que não precisa. Senti que tínhamos saído da zona
pesada da Terra, pois ali estava calmo. A brisa apenas conseguia mexer alguns
fios do meu cabelo. Ele olhou pra mim e disse que passaríamos a noite ali e que
bastava esperar. Mas pensei: “esperar o que?”. Mas uma vez eu confiei e sem
questionar eu disse: “tudo bem”. Ele pegou no sono rapidamente, eu ainda fiquei
a olhar as estrelas, mas o sono me pegou quando eu menos esperava e dormir por
horas.
Acordei com o barulho do mar. Como assim mar? Não sei como,
mas eu estava numa praia. Olhei ao redor e pude ver duas casinhas. Era meu
sonho de infância concretizando-se: morar em frente ao mar. Levantei e fui
procura-lo. Achei-o sentado na areia a poucos metros de onde eu estava e perguntei:
- Com viemos parar aqui?
- Não interessa isso agora, Amanda. Só interessa que estamos
aqui.
Ali pude ter a certeza de que o amor faz coisas que o homem
duvida e que não havia explicação. Já estava ao entardecer. Sentei ao lado dele, segurei sua mão e
perguntei:
- Tudo estará como antes?
- Não pense nisso agora, a gente vê com o tempo. Mas tenho
uma surpresa pra ti.
Olhei pra trás e vi meu pai e eu não acreditei, não tive condição
de trocar uma palavra, eu só chorava. Abracei-o e pude sentir o que eu senti há
anos atrás quando ele chegava do trabalho. Fomos em direção ao mar. Sentei de
uma forma em que a água pudesse tocar os meus pés, em que o vento pudesse tocar
o meu rosto e que eu pudesse ver os dois juntos. Era estupendo vê-los conversando.
E ali tive a certeza de que um era o espelho do outro e que eu precisava dos
dois pra me sentir totalmente completa ou pelo menos só de um para que eu possa
ter forças o suficiente para continuar em pé. O tempo fechou e trovejou.
Levantei do sofá e desliguei a tv.
Mands Gama
19 de Novembro de 2012
22hrs42min